Hoje a gente estréia no blog uma coluna super especial sobre medicina de viagem! Quem vai falar sobre esse assunto tão importante é o médico infectologista da Fiocruz Hugo Boechat. E o primeiro texto dele é sobre o mal da montanha! Uma das grandes preocupações de quem planeja visitar Machu Picchu e a região de Cusco. Vamos saber mais?
Leia sobre a nossa viagem ao Peru:
O mal da montanha, também conhecido como mal ou doença das alturas, ou hipobaropatia, é relacionado com os efeitos da altitude no organismo humano, causados por exposição aguda à baixa pressão parcial de oxigênio em altas altitudes (hipoxemia hipobárica). Ocorre normalmente acima dos 2.400 metros de altitude. Acredita-se que seria devido à dilatação local dos vasos sanguíneos (cerebrais, pulmonares) em resposta à falta de oxigênio.
Embora a pressão atmosférica dentro dos aviões seja mantida a um equivalente a 2.400m ou menos, alguns passageiros podem sentir alguns dos sintomas da doença das alturas em longos vôos.
Outro sinônimo, “sorochi“, veio da América do Sul e originalmente significava “minério”, por causa de uma antiga crença, obviamente equivocada, de que a doença era causada por “emanações tóxicas” de minérios nas montanhas dos Andes.
Sintomas do mal da montanha
O mal de montanha agudo acomete uma boa parcela de visitantes de lugares elevados, com diversos sintomas, tais como:
- Falta de apetite, enjôo, vômitos, eventualmente diarréia. Comum a confusão com gastroenterites e intoxicações alimentares!
- Fadiga ou fraqueza
- Tonturas ou vertigens
- Insônia, sono agitado, despertar fácil
- Respiração irregular durante o sono
- Parestesia (dormências)
- Falta de ar aos esforços
- Hemorragia nasal
- Batimentos cardíacos acelerados
- Sonolência
- Mal estar geral
- Edema periférico (inchaço das mãos, pés e face)
Os sintomas podem aparecer de 4 a 12 horas após a chegada, variando de extremos de 1h até 24h. Regride geralmente após as primeiras duas noites na nova altitude e não ocorrem após 3 dias ou mais na localidade. Esse é o tempo normal de aclimatação.
A dor de cabeça é o sintoma primário usado para diagnosticar a doença de altitude, apesar de uma dor de cabeça também ser um sintoma de desidratação. Esta, devido à maior taxa de vapor de água perdida dos pulmões a altitudes mais elevadas, pode contribuir para os sintomas da doença de altitude, acima citados.
É difícil determinar quem será afetado por este mal, pois alguns já começam a ter sintomas leves a partir de 1.500 a 2.000 metros, contudo, a grande maioria das pessoas é capaz de chegar aos 2.400m sem dificuldade. É certo que correm mais risco os que já apresentaram um ou mais episódios, as mulheres, aqueles com menos de 46 anos e os que sofrem de enxaqueca, além dos que fizeram exercício extenuante antes da subida.
Boa forma física não exerce efeito protetor. Pacientes com anemia, doenças pulmonares e cardíacas têm um risco maior de apresentar formas mais graves e complicadas, ou ter suas doenças de base agravadas pela altitude. Essas pessoas devem procurar seu médico para orientações antes da viagem.
A velocidade de subida, altitude atingida, quantidade de atividade física em altitude elevada, bem como a susceptibilidade individual, são fatores que contribuem para o aparecimento e a severidade da doença das alturas.
As altitudes responsáveis por levar a problemas, dividem-se em três categorias:
– Moderadas: entre 2.400 a 3.600 metros – predominância de quadros leves a moderados
– Altas: entre 3.600 a 5.400 metros – aumento significativo de casos graves.
– Extremas: superior a 5.400 metros. Não existem habitações humanas nesta faixa, é necessário um programa rigoroso de aclimatação.
Prevenção do mal da montanha
- Sempre é recomendável, antes de qualquer viagem, uma consulta de Medicina de Viagem, ou pelo menos com o médico assistente que faça o acompanhamento de alguma doença crônica que porventura o viajante possua. A prevenção é sempre a melhor conduta.
- De modo geral, a melhor maneira de evitar o mal da montanha é subir lentamente. Se você vive abaixo de 1.500m, evite uma subida rápida. Na primeira noite, não durma em local acima de 2800m, leve pelo menos dois dias para chegar aos 2.500-2.800m.
- Se a viagem passará dos 3.000m, não aumente a altitude em que dormirá mais do que 500m por dia, planejando um dia de descanso para cada 1.000 metros de subida. É importante fazer aclimatação entre 2.000 e 3.000 metros por uma semana, pelo menos, antes de subir mais de 4.500-5.000 metros.
- Gestantes devem evitar locais a mais de 3.600m. Pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica, hipertensão pulmonar, angina instável e anemia falciforme não devem ir a locais de altitude muito elevada.
- Pessoas que viajam em grupo tendem a esconder ou minimizar os sintomas para não atrapalhar o passeio e prejudicar o grupo. Não faça isso! Se estiver sentindo alguma coisa procure ajuda.
“Climb high and sleep low” – Passear em altitudes maiores durante o dia e dormir em altitudes menores à noite, ajudam na aclimatação. - Se você pretende praticar exercícios (esqui, trilha, corrida, escalada, etc), não exagere nos primeiros dias, principalmente nos 2 primeiros da mudança de altitude.
- Se você consome bebidas com cafeína (café, chá, refrigerantes) regularmente, não mude seu hábito. Cafeína é segura a altitudes elevadas, porém sem benefício comprovado, e sua interrupção pode causar sintomas similares ao mal da montanha.
- Cuidado ao beber álcool, principalmente durante a aclimatação. Bebida alcoólica consumida a grandes altitudes parece ter o mesmo efeito que duas consumidas ao nível do mar. Além disso, os sintomas que a ingestão de grandes quantidades de álcool provoca são semelhantes a algumas formas de mal da montanha, mascarando ou piorando a percepção dos sintomas. Uma dose, no entanto, não parece causar prejuízos.
- Tabagismo: o fumo causa uma baixa crônica de oxigênio no sangue e pode piorar os sintomas. O ideal seria sua interrupção semanas antes da viagem. Durante a aclimatação, recomenda-se fumar menos. A interrupção abrupta pode causar abstinência e mal estar como a cafeína.
Não fazer uso de remédios calmantes/sedativos para dormir sem a devida orientação médica. Podem deprimir a respiração, principalmente durante o sono, prejudicando ainda mais a oxigenação. - Boa hidratação. Beber mesmo sem ter sede, pelo menos 1 litro por dia. O volume de consumo de líquidos deve ser aumentada de acordo com o aumento da atividade física.
- Evitar o sal ou os alimentos salgados pode ser benéfico. Comer frequentemente pequenas quantidades de alimentos ricos em carboidratos é melhor do que ingerir pratos abundantes três vezes por dia.
- Folhas de coca e chá de coca ou muña são muito usados pelas populações locais nos Andes, sem qualquer comprovação de benefício, seja para prevenir ou tratar os sintomas.
- Existem medicamentos para prevenir o mal da montanha, para saber se são indicados para o seu caso, agende uma consulta médica antes de viajar.
Tratamento
Não deixe de fazer um seguro de viagem! É muito importante para garantir o seu bem estar fora de casa!
- REPOUSO: fundamental o repouso até a adequada aclimatação.
- Oxigênio: é comum achar fontes de oxigênio em hotéis e outros locais públicos, ou comprar em farmácias. Uma hora de uso pode ser suficiente para melhorar os sintomas leves. Algumas pessoas precisam dormir com oxigênio.
- DESCER: descida de 500 a 1.000 metros geralmente controla os sintomas e retira o paciente de possível gravidade.
- Alguns analgésicos e antieméticos podem ser administrados, mas para isso é indicado uma consulta médica antes da viagem.
- Os sintomas que podem indicar risco de morte e são mais frequentes entre 1 a 4 dias acima de 3.500 metros, são:
- Edema pulmonar (líquido nos pulmões): Sintomas semelhantes aos da asma/bronquite, como peito congestionado; tosse seca persistente; febre; falta de ar mesmo quando em repouso; aspecto pálido e manchas na pele; cianose: lábios e extremidades arroxeadas
- Edema cerebral (inchaço do cérebro): Dor de cabeça que não responde a analgésicos; distúrbios visuais; confusão mental, agitação, agressividade; marcha instável; perda gradual da consciência; aumento de náusea.
PROCURAR ATENDIMENTO MÉDICO COM URGÊNCIA EM CASO DOS SINAIS DE ALERTA ACIMA E PIORA PROGRESSIVA.
Se você está planejando uma viagem para o Peru, leia também: 10 coisas que não te contam sobre Cusco do blog Chicas Lokas.
REFERÊNCIAS
http://www.cives.ufrj.br/informacao/altitude/altitude-iv.html
http://www.high-altitude-medicine.com/AMS-medical.html
http://www.merckmanuals.com/professional/injuries-poisoning/altitude-diseases/altitude-diseases
https://pt.wikipedia.org/wiki/Mal_da_montanha
2 comments
ótimas dicas e tema, não senti quando estive em Cusco, mas senti no Atacama. É sempre bom entender melhor esse mal de altitude.
Oi Ana Paula, sabe que eu senti em Cusco, e por isso procurei saber mais para me prevenir melhor na próxima. O mal da montanha é uma sensação bem ruim. Ainda bem que senti só no ultimo dia de viagem.